Quase a meio caminho entre Adis Abeba e Turmi, a cerca de quinhentos quilómetros de Turmi, está Arba Minch.
É uma jovem, acolhedora e bem apetrechada cidade, com vários hotéis e um aeroporto, situada no Vale do Rift.
E é o Vale do Rift que lhe dá encanto e o seu nome, "quarenta nascentes". Tradicionalmente conta-se que é este o número de nascentes que rodeiam a cidade e que têm origem neste vale
Arba Minch está aninhada entre os lagos Abaya e Chamo. Uma língua de terra, a Ponte de Deus, une os dois lagos. Na época das chuvas esta língua desaparece.
Arba Minch é um ponto de paragem obrigatório para quem se dirige para sul, para a Etiópia etnográfica, para a Etiópia das tribos.
As minhas mãos voltaram ao tamanho normal, à entrada do Tourist Hotel. Um lugar incaracterístico e muito kitsch, pensado para ocidentais. Tinha lá marcado o meu almoço.
A segurança barrou a entrada de toda aquela gente pequena.
Não me lembro dos seus nomes ou rostos, apenas sei que eram muitos. Muitos pardais à solta.
É uma jovem, acolhedora e bem apetrechada cidade, com vários hotéis e um aeroporto, situada no Vale do Rift.
E é o Vale do Rift que lhe dá encanto e o seu nome, "quarenta nascentes". Tradicionalmente conta-se que é este o número de nascentes que rodeiam a cidade e que têm origem neste vale
Arba Minch está aninhada entre os lagos Abaya e Chamo. Uma língua de terra, a Ponte de Deus, une os dois lagos. Na época das chuvas esta língua desaparece.
Arba Minch é um ponto de paragem obrigatório para quem se dirige para sul, para a Etiópia etnográfica, para a Etiópia das tribos.
Arba é uma cidade extremamente jovem, ou não tivesse uma universidade e várias
escolas.
Se tivermos a sorte de assistir à saída das escolas, são enxames de miúdos
de mochilas às costas, a maior parte deles descalços.
Andam ligeiros, desordenados, aos pulos, às gargalhadas, aos gritos, em querelas com calduços
e rasteiras.
“Parecem bandos de pardais à solta. Os putos, os putos”
É assim que eles surgem à minha frente.
Uma ilustração vivida da voz de Carlos do Carmo que ecoa nos meus ouvidos a cantar o extraordinário poema de José Carlos Ary dos Santos, Os Putos.
É assim que eles surgem à minha frente.
Uma ilustração vivida da voz de Carlos do Carmo que ecoa nos meus ouvidos a cantar o extraordinário poema de José Carlos Ary dos Santos, Os Putos.
Um branco duas vezes mais alto do que eles e com uma mochila vermelhas às
costas, deve ser uma ave rara em Arba Minch.
Dois agarram as mãos. A seguir, outros e outros foram dando as
mãos uns aos outros.
As minhas mãos alongavam-se numa cadeia feita por dezenas de outras. Por vezes um dos maiorzitos empurrava um dos
mais pequenos e interrompia a cadeia apenas por uns breves instantes.
Em todo o lado é assim, são os maiores mandam nos mais pequenos.
Em todo o lado é assim, são os maiores mandam nos mais pequenos.
Protegi uma pequenita que tinha conseguido chegar à minha mão esquerda. Os seus dedos agarravam-me com tanta força que estavam brancos.
Não ia ser fácil tirá-la dali. O sorriso era enorme, rasgado às nuvens do céu. Todos os seus dentes eram visíveis.
Os últimos a sair das escolas também corriam ao meu encontro. À minha volta, para onde me virava, havia sempre uma nuvem de cabeças que pouco passavam da minha cintura a pulular.
Cabeças viradas para mim e olhos grandes e brilhantes fitavam-me.
Tinha dificuldade em andar devido aos que me agarravam pelas calças.
- What’s your name, what’s your name?
- Pedro, Pedro. Venho de Portugal.
- Petro, Pedo, Puedo, Pdo???
- Pe-dro, Pe-dro
- Pe-dro, Pe-dro
Inutilmente marcava as sílabas.
O meu nome era repetido dezenas de vezes todas elas diferentes.
O meu nome era repetido dezenas de vezes todas elas diferentes.
Climax?? Foi quando coloquei a mochila no chão e mostrei o que estava lá
dentro.
Bolachas, barras, fruta, rebuçados, tudo voou.
Bolachas, barras, fruta, rebuçados, tudo voou.
Em troca, disse-lhes que também queria ver as mochilas deles. De joelhos ou de
cócoras vimos as mochilas uns dos
outros.
Cadernos surrados cheios de caracteres que não conhecia, letras tortas ou letras
certinhas, blocos de notas, lápis, uns com bico, outros sem ele, borrachas irregulares e esfareladas.
As minhas mãos voltaram ao tamanho normal, à entrada do Tourist Hotel. Um lugar incaracterístico e muito kitsch, pensado para ocidentais. Tinha lá marcado o meu almoço.
A segurança barrou a entrada de toda aquela gente pequena.
De costas para o segurança, abri os braços como quem diz "agora vai ter que ser, é o adeus".
Uns estenderam-me a mão formalmente, outros abraçavam a minha cintura. De novo de cócoras, fui abraçado. Pequenos troncos perdidos no meio de um grande. Alguns esticavam as mãos para dar chocas.
De novo a diferença de escala: mãos pequenas escuras batiam numa manápula branca. Umas delicadas, outras bem firmes e determinadas.
Sentia-me bem. Mesmo bem.
Estava cheio de energia positiva. Sentia o seu pulsar.
Eles tinham dado muito mais do que receberam. E provavelmente nem desconfiavam disso.
Uns estenderam-me a mão formalmente, outros abraçavam a minha cintura. De novo de cócoras, fui abraçado. Pequenos troncos perdidos no meio de um grande. Alguns esticavam as mãos para dar chocas.
De novo a diferença de escala: mãos pequenas escuras batiam numa manápula branca. Umas delicadas, outras bem firmes e determinadas.
Sentia-me bem. Mesmo bem.
Estava cheio de energia positiva. Sentia o seu pulsar.
Eles tinham dado muito mais do que receberam. E provavelmente nem desconfiavam disso.
Não me lembro dos seus nomes ou rostos, apenas sei que eram muitos. Muitos pardais à solta.
É tão bonito e comovente o que escreves!
ResponderEliminar"Eles tinham dado muito mais do que receberam. E provavelmente nem desconfiavam disso." :)
Voltarei...Abraço