São cem anos de história com noventa metros de comprimento por vinte e quatro de altura, plenos de ingenuidade, elegância e beleza. A Nine Arch Bridge é um rasgo curvo de castanho férreo e suportada por colunas manchada de escuro, numa densa tela verde feita de floresta e plantações de chá. Apenas construída com pedra e cimento. O aço que se destinava à sua construção foi desviado para ser utilizado no esforço de guerra da primeira Guerra Mundial.
Pisar terrenos que usualmente não temos acesso, onde a vida inteira nos dizem que andar por eles é perigoso, é extremamente aventuroso e excitante. Por isso, caminhar despreocupadamente nos carris da Nine Arch Bridge, depois do percurso cénico de Hatton até Ella, era a cereja no topo do bolo.
Os locais que andavam por ali disseram que o comboio passava mais ou menos de hora a hora. Mas que se atrasava frequentemente. Eram dez e pouco da manhã. O último tinha passado pouco antes de eu chegar à linha. Tinha cerca de uma hora para cirandar pela ponte.
Para chegar até ela foi simples: sair do hostel, apanhar um caminho secundário pavimentado com gravilha rosada que descia suavemente; continuar por onde roupa colorida e bem organizada secava num estendal improvisado, passar por um café com um acanhado alpendre por onde se adivinhava a ponte entre a densa vegetação, nele uma senhora lavava roupa num enorme alguidar; prosseguir até encontrar um trilho razoavelmente íngreme e algo instável à nossa esquerda; descendo por ele com cuidado passando por vegetação que me pode cortar as mãos se me agarrar a ela descuidadamente.
Chego à linha. Ando ligeiro e despreocupado. Sincronizo os meus passos com as travessas de madeira. Consigo-o durante pouco tempo. Rapidamente desisto de continuar. O espaço entre elas é pequeno e torna os meus passos demasiado sincopados e desconfortáveis.
As ligações metálicas que fixam as travessas de madeira estão impregnadas de creosoto que lhes dá o cheiro tão característico das linhas de comboio - um jovem caminhava pela linha passando este viscoso líquido preto obtido pela destilação do alcatrão, alguns metros à minha frente. Toco com os dedos nesta massa de aspecto quase imunda feita de uma mistura de terra, óleo, ferrugem. Eles ficam cheios de uma gordura negra desagradável ao toque. Limpo-os às solas das botas. Mesmo assim...
O túnel. Caminho para ele e sinto-me desprotegido e claustrofóbico à medida que o atravesso. Não fujo destas sensações, antes aprecio-as. A adrenalina flui por mim suavemente: o comboio passa de hora a hora, mas... e se se adiantar ou passar de repente sem aviso enquanto estou aqui metido?
Numas das extremidades uma família fotografava-se à vez. No lado oposto, uma espanhola, loira e bonita, de calções curtos de ganga exibindo umas pernas bem desenhadas, fotografa o namorado à entrada do túnel. Nas costas dela, uma tabuleta diz que a velocidade máxima de circulação das composições é de 15 km/h.
O túnel está coberta pela fuligem do gasóleo, onde a luz ainda entra as paredes refulgem e reflectem em anéis concêntricos o verde da vegetação. Entretanto um pastor desce a encosta com três vacas e continua com elas pela linha fora.
Podia ser um piquenique domingueiro de uma família qualquer. Transportam-se cadeiras e pequenas mesas de campismo, levam-se pequenos lanches, procuram-se sombras e experimentam-se vários sítios possíveis para o ver passar e fotografar.
Uma árvore frondosa oferece uma sombra generosa. Debaixo dela estão bancos de madeira que já estão ocupados.
Estou de costas para o túnel, no alinhamento da curva do murete, próximo de uma vaca castanha que pasta calmamente. Do meu lado esquerdo, vários tuk-tuk estão arrumados lado a lado. Quem não quer caminhar até à linha pode chegar até aqui neles.
O comboio faz-se anunciar: há um rufar metálico e ritmado e os carris vibram moderadamente.
Passa sem pressa. Mas faz agitar os cabelos compridos das mulheres. Sinto o seu roncar no peito e o bafo morno do seu cheiro a abraçar e a inundar-me como o perfume recentemente colocado de uma mulher que acaba de sair de casa. Fotografar é um acto de amizade reciproco entre vai e quem vê passar. E os acenos também, até ele entrar na escuridão uterina do túnel.
Um espectáculo sui generis!!
ResponderEliminarDe facto, tem um travo de surrealidade.
EliminarMas é altamente! :)
NO CABE DUDA QUE LES FALTA PUEBLO!!!, PERO SE AGRADECE SU HISTORIA POÉTICA VERSALLESCA.
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