série "Rostos do meu Rosto" - XXXIII

Tinha saído de um dos templos que mais me fascinou no complexo de Angkor Thom, Bayon.
A cerca de três centenas de metros dele, surge outro igualmente imponente, embora não tão artístico: o templo de Baphuon.
Esses trezentos metros mudam tudo. Mudam o rei que os construiu, mudam a arquitetura, mudam a quem foram dedicados - Bayon, dedicado a Buda; Baphuon, a Shiva - e representam um recuo de 140 anos no tempo. O templo Bayon foi erguido por volta de 1200 d.C., enquanto Baphuon remonta a cerca de 1060.

Faço uma viagem no tempo e aproximo-me do templo de Shiva. Surge o que parece ser uma piscina. Boa parte dela está coberta superficialmente por uma vegetação aquática de um verde denso. 
Discretamente, junto-me a um pequeno grupo de turistas, que tinha parado ali perto, acompanhados por um guia, e escuto as explicações e ouço o que pretendia. A piscina é um srah. Cumpre um duplo propósito: rituais de purificação e a representação simbólica do mar infinito que rodeia e envolve o cosmos hindu. 
O grupo avança no seu tour, separo-me dele e contemplo aquele srah, o mar cósmico.

Materializando-se do nada, surgiu uma senhora que pedalava em direção ao grupo que eu havia deixado. À frente da bicicleta, uma cesta de vime estava cheia de garrafas e snacks. Fez algumas vendas e, em seguida, aproximou-se de mim. Apontou a mão para a cesta e aguardou que eu escolhesse algo. O lenço na cabeça, o seu rosto inexpressivo e o olhar aparentemente ausente tornavam a sua presença profundamente hipnotizante.
Assim que reparou na câmara pendida para baixo, ao longo do meu braço, por meio das suas mãos disse-me que uma fotografia sua custava “one dollar”. 
Por princípio, não pago por uma fotografia; mas, se ao comprar algo a imagem me for concedida, aceito o negócio. E tal aconteceu.
O que lhe comprei, uma garrafa de água de litro e meio e uma mistura de frutos secos, custou-me mais do que um dólar. Ainda assim, poder fotografar o krama (lenço típico khmer), os seus olhos profundamente iluminados pela luz que nos envolvia e o rosto enigmático daquela senhora foi um privilégio.
Um excelente negócio. Ambas as partes ganharam.






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