Ruanda - o germinar do Genocídio


Com a grande chacina de tutsis às mãos de hutus em 1959, dá-se uma fuga de tutsis para o vizinho Burundi.
Estes refugiados ao longo dos anos, junto à fronteira com o Ruanda, vão lançando pequenos ataques de guerrilha.
Por causa destes ataques eles ganham a alcunha de "baratas". Algo que tem que ser esmagado, uma praga a exterminar.

Em 1963 organizam-se e fazem um decidido ataque ao Ruanda. Vêm o seu avanço parado pelo exército ruandês já muito próximo da cidade de Kigali.
O exército contra-ataca decidido a exterminar as "baratas". Em pouco mais de uma semana são mortos indiscriminadamente cerca de 14 mil tutsis. Incluindo mulheres e crianças.

Como consequência, o movimento de refugiados para o Burundi aumenta. No início de 1964 calcula-se que 250 mil tutis estejam dentro das fronteiras deste país.
No Burundi os papeis estão invertidos. São os tutsis que estão no poder e são estes a maioria e por sua vez os hutus são reprimidos e oprimidos.

É sem surpresas que em 1973, no Burundi, acontece uma segunda matança mas em sentido oposto.
Desta vez são chacinados às mãos dos tutsis 100 mil hutus e 200 mil refugiam-se nos países vizinhos incluindo naturalmente o Ruanda.
O desejo de vingança cresce e numa filosofia de "olho por olho e dente por dente" a perseguição e o assassinato de hutus volta a crescer no Ruanda.

O ministro da defesa ruandês, o general Habyarimana, ele próprio um hutu moderado, assume o poder e pede uma trégua entre tusis e hutus.
Mas as sua acções eram o oposto do que afirmava. Proíbe tutsis no exército, proíbe casamentos mistos, confisca bens de tusis acusados de incitarem à violência e fecha os olhos aos massacres que iam ocorrendo
Irá manter-se no poder até 1994.

Habyarimana torna obrigatório o trabalho em prol da comunidade. Com isto a pressão sobre os tutsis e aumenta assim como sobre os hutus moderados que conviviam com tusis, aproximando-os ainda mais das baixas condições de vida destes últimos.
O Ruanda para além das enormes tensões sociais que vive, sofre em 1989 a queda brusca nos mercados internacionais dos produtos que mais exporta, chá e café.
Os rendimentos do país entram em baixa e em contrapartida sobem os impostos e o trabalho obrigatório aumenta.
Tutsis e hutus moderados sofrem ainda mais e vêm a sua exclusão social aumentada. Do outro lado estavam todos os hutus que estivessem revoltados com a situação do país e ainda todos aqueles que estavam ligados ou próximos do poder e que não queriam perder os privilégios que tinham.

Entretanto os tutsis no exílio voltam a reforçar-se e a organizar-se. Em 1990 lançam um segundo ataque desta vez a partir do Uganda e de novo são repelidos pelo exército ruandês.
Esta segunda tentativa dá a Habyarimana o pretexto necessário para declarar todos os tutsis e seus cúmplices (hutus moderados) como inimigos dos hutus e como tal deveriam ser esmagados.

Foram elaboradas listas com nomes de possíveis traidores. Os mais influentes, ricos, e instruídos encabeçavam essas listas e foram os primeiros a serem procurados. Dez mil pessoas terão sido presas dando origem uma nova onda de massacres.

A comunicação social ruandesa pro hutu por sua vez manipulava as opiniões publicando notícias falsas, exacerbando o ódio contra tutsis.
Falsos ataques, conspirações e descobertas de documentação falsa e até a acusação de que os tutsis usavam feitiçaria contra hutus eram constantemente divulgados por todo o país.
O exército ruandês simulava ataques contra eles próprios para fundamentar e influenciar a população hutu no perigo que os tutsis representavam.

Milícias eram formadas um pouco por todo o lado. Jovens tutsis são recrutados e treinados para defender o país. Aprendem a manipular e a construir armas, a utilizar granadas de mão, facas e bastões. Aprendem a incendiar casas.
A Interahamwe - aqueles que atacam juntos - a mais importante e bem treinada dessas milícias defendia claramente e abertamente o genocídio dos tusis.

A rádio Ruanda, nas mãos do governo, declara em Março de 1992 que um plano tutsi para massacrar hutus fora descoberto. Sob este falso pretexto e proclamando auto-defesa, na região de Bugesera a sul de Kigali, a milícia interahamwe massacra 350 tutis em três dias. O mesmo aconteceria noutras regiões do país.

Oito meses depois, em 22 de Novembro de 1992, o líder e ideólogo Hutu, Leon Mugesera, num congresso do partido hutu perante mil pessoas, proclamou um discurso inflamado, um discurso de incitação ao ódio que para muitos marcou o início do genocídio que aconteceria dois anos depois.
Nesse discurso Mugesera exorta os seus colegas a "assumir a responsabilidade de varrerem a escumalha, matando os tutsis e deitando os seus corpos aos rios do Ruanda" e pergunta "o que estamos à espera para os dizimar?". A propósito do massacre de 1959 acrescentou "ter sido um erro deixar sobreviver os tutsis."
"Não importa o que façam ou tenham que fazer, mas não os deixem escapar".


Uma brutal tempestade de violência, sangue e morte, estava prestes a eclodir.



Ruanda - As sementes do Genocídio

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