Irão - a revolução silenciosa



É um clássico.
Desde que o avião não pertença à companhia aérea do Irão (Iran Air) é possível assistir à dança dos lenços e túnicas.

Poucos minutos antes do avião da Turkish Airlines pousar na madrugada do aeroporto de Teerão, as echarpes que abraçavam os pescoços e as túnicas que estavam escondidas nas malas, ganham novos usos.

Em volteios rápidos e desenvoltos, as echarpes passam a lenços tapando os cabelos, e as túnicas cobrem os corpos femininos.
De mulheres de aspecto ocidental passam a mulheres islâmicas em poucos minutos.

Esta cobertura do rosto e do corpo chama-se hijab, véu.
O hijab tem vários níveis. Vai desde o simples lenço que tapa a cabeça e os cabelos até à temível burqa afegã e paquistanesa que cobre literalmente a mulher da cabeça aos pés, olhos incluídos. 
Apenas uma rede ao nível dos olhos lhe permite ver por onde andam.

O Irão é um dos países mais restritivos no que respeita ao uso dos véus islâmicos.
Na maioria dos casos elas usam o lenço, com alguma frequência o "chador" (significa tenda) que cobre totalmente a mulher, mas tem o rosto completamente visível e pontualmente o severo niqab, que apenas permite que os olhos sejam visíveis.

É uma das imagens mais fortes que retenho do Irão, os fantasmagóricos vultos negros que vão flutuando juntos aos passeios, a atravessar uma estrada ou a cruzar as arcadas de adobe de Yazd.






É sempre muito apetecível e desejável contornar as regras daquilo que é proibido, daquilo que é imposto.
As iranianas estão longe de serem a excepção. O hijab e a utilização de túnicas para disfarçar as formas femininas é obrigatório.
A Polícia dos Costumes encarrega-se de garantir que este dress code islâmico é cumprido.

Mas uma revolução silenciosa e pé ante pé, está mudar todas estas obrigações.
O que começou por tapar integralmente todo o cabelo, está aos poucos e poucos a recuar. Literalmente.
Como muitas mulheres por todo o mundo, a maior parte das iranianas têm cabelos compridos.
Inteligentemente vão fazendo recuar o véu, o lenço, até ao ponto onde o cabelo está apanhado. É aqui que o lenço fica preso. Mais de metade da cabeça e dos cabelos ficam assim descobertos.




As túnicas vão tornando mais justas, cintadas e suavemente as formas femininas vão vendo a luz do sol. As calças tornam-se justas e os saltos vão fazendo a sua aparição lado a lado com os ténis.
O preto nas vestimentas ainda está presente, principalmente nas mulheres mais velhas e conservadoras, mas as cores vão rompendo este manto negro.
A Polícia dos Costumes vai fechando os olhos a esta fintas às regras.
Mas quando corre mal, corre mesmo. Pelo menos uns dias na prisão é vulgar.


Pintam o rosto, as unhas das mãos e dos pés. Algo que há relativamente pouco tempo era igualmente proibido. Vemos nas ruas que existem discretas tatuagens e até alguns piercings.
A preocupação com a imagem, particularmente nas classes mais altas da sociedade iraniana, chega ao ponto de as cirurgias plásticas ao rosto, especialmente ao nariz, se tornarem quase uma praga e com resultados sempre duvidosos. O nariz fica empinado, a apontar para o céu. Perde a sua naturalidade.
As iranianas têm rostos de traços delicados, bonitos e exóticos.
Se há mulheres que dispensam uma plástica ao rosto, as iranianas contam-se entre elas.
Mas o status social...

Em casa são mulheres normais. Andam descalças, cabelos soltos, saias, calças de ganga justas ou leggings.
Nos transportes públicos, há zonas diferenciadas para eles e para elas.
Num táxi, à frente só podem ir homens. Se houver mulheres estas vão atrás.
"Vedações" separam os compartimentos nos comboios, no metro, nos autocarros, No entanto se elas resolverem entrar nas áreas para os homens, nada de mal acontece. Na pior das hipóteses, levam com os olhares reprovadores deles.
Além que é mais frequente, as mulheres "invadirem" o espaço dos homens do que o contrário.


Tirar fotografias a mulheres é complicado. O maior dos seus medos é a divulgação pública do seu rosto.
Quando pedi a uma jovem estudante muito bonita, num jardim de Kashan, chamada Laleh (túlipa) se me deixava tirar-lhe uma fotografia, ela assentiu. Logo depois perguntou o que ia fazer com ela.
Disse-lhe que não ia pôr no FB ou no Instagram. O que provavelmente iria fazer era colocar a fotografia no meu blogue de viagens. Por isto, perdi a sua fotografia.


Comentários

  1. "Perco-me" aqui....:)
    Porque há muito para ler e interiorizar. Lendo o que escreves, é como se viajasse um pouco contigo também. E ficasse a conhecer melhor todos os locais e povos que descreves. E assim, atenuo a minha "inveja" :)))))

    Gosto muito da foto, apesar de não ser a que tu querias....É o olhar de uma jovem segura de si e com confiança no futuro. Oxalá ele seja mais risonho do que para as suas mães e avós.
    Beijinho

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    1. Oi Andorinha :)
      As mulheres quando se deixam fotografar são realmente confiantes. Transportam em sim a "revolução silenciosa".
      Acredito que no médio prazo, elas consigam os objectivos que almejam: a liberdade e igualdade do género.
      Um beijinho

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  2. E tens de «Tirar fotografias a fotografias» porque as tuas não devem ser nada de jeito :P

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    1. A inveja é uma coisa mesmo muito feia.
      Aprende, aprende,....
      Um beijinho :)

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