série "Rostos do meu Rosto" - I

Sempre que viajo, presto atenção aos rostos que me recebem, vejo as suas diferenças e às semelhanças com o meu. Mas são as diferenças que procuro.
Fotografar um rosto é um acto de fé por quem se deixa fotografar. E é um privilégio para quem fotografa. É uma extrema confiança que flui num só sentido: de mim, que sou fotografado, para ti, que me fotografas. Tu podes confiar em mim, mas eu não sei se posso confiar em ti, mas mesmo assim fotografa-me.
É uma exposição consentida. Mostra a sua cultura, mostra as imperfeições do rosto. Os seu olhos vão falar, o tal espelho da alma, as suas emoções que possam estar à flor da pele.

Os rostos mais velhos são sempre os mais atraentes, os mais bonitos, os que mais admiro. Neles correram grossas lágrimas e rasgaram sorrisos luminosos. Olharam a vida de frente e venceram a prova do tempo. Têm história.
Os mais novos são bonitos, por serem... bonitos. Porque estão intocados, pouco ou nada mordidos pelo tempo. São livros de páginas em branco. Pergunto-me frequentemente o que irá ser escrito nesses livros, com que cores, se será uma história bonita, longa, ou não.

Esta série "Rostos do Meu Rostos", são os rostos que estão no espelho à minha frente mas que não os vejo. Tenho que ir a suas casas, aos seus países, e ao meu, para os conhecer. 


Começo a série com o Pipo.
2009. Eu estava na América Central, Honduras, para visitar as ruínas maias de Copán. 
Bebia ao final do dia um enorme copo de frutas tropicais esmagadas à minha frente. Sem gelo, para evitar alguns acidentes intestinais. Quando viajo gosto, sempre que possível, de fechar o dia num jardim, num canto sossegado a ver a vida local a passar. Lembro-me de estar sentado num banco de um pequeno jardim com as pernas esticadas numa pose relaxada. Na altura tinha uma pequena câmara compacta de bolso, uma "point and shoot".

Um puto de repente surge à minha frente, posa descontraidamente e pede-me para o fotografar, o que faço sem rodeios. Perguntei-lhe o seu nome - Pipo, respondeu - e depois fui com ele e ao vendedor de sumos e ofereci-lhe um copo à sua escolha. 
Fosse assim a vida tão simples e descontraída.






Comentários

  1. Gostei muito do texto e das fotos. Do texto realço duas frases:
    "Neles correram grossas lágrimas e rasgaram sorrisos. Olharam a vida de frente e venceram a prova do tempo." Os mais velhos.

    "São livros de páginas em branco. Pergunto-me o que irá ser escrito nesses livros, com que cores, se será uma história longa ou não." Os mais novos.

    Em tão poucas palavras, tanto que é dito. O fluir "normal" da vida...

    Quanto às fotos, a que mais me tocou foi a do menino do Quénia. Uns olhos penetrantes que me fitaram durante tanto tempo e continuam a fitar. Parece que está aqui à minha frente e "sinto-me" a sorrir para ele.

    Obrigada, Pedro, pelo que aqui partilhas.
    Beijinho

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