aldeias de xisto, Talasnal - uma aldeia betinha


Do grupo de aldeias de xisto da Lousã, Talasnal é mais bem preparada para receber turismo. O que não a torna a mais interessante delas. Bem planeada, foi e está a ser alvo de uma recuperação cuidada e pensada de raiz para servir e atrair o turismo.
Comparada com outras aldeias, será uma aldeia betinha. Está arrumadinha e penteadinha. Se fosse uma pessoa, usaria camisa a condizer com as calças de marca com pregas, um pullover sobre os ombros com as mangas a caírem sobre o peito, cabelo escovado para o lado, talvez seguro com laca, e sapatos de vela bem engraxados.
No entanto, nos seus tempos áureos, era conhecida pela produção de azeite e pelos seus dois lagares.

Em Talasnal há uma personagem que marca um pouco a sua história actual, a Ti Lena. Foi a sua última habitante, morreu em 201. Contam que tinha olhos azuis e um lenço permanentemente colocado na sua cabeça. O seu marido era o Ti Manuel e consta que ele tocava bem flauta. Tentei descobrir um pouco mais da história deste casal no restaurante que tem o seu nome, mas a azáfama de um restaurante que só funciona por marcação, não permitiu que as proprietárias contassem a sua história.

Esta é a aldeia que Pedro, de Vaqueirinho, tinha dito que estava adulterada, "desvirtuada" pelo turismo. Em parte, ele tinha razão.


Está, como quase todas as suas irmãs, a cerca de quinhentos metros de altitude numa encosta da Serra da Lousã, com vista para um imenso vale verde.
Enquanto se sobe na estrada serpenteante, um subtil rasgo na cortina de árvores que a ladeia permite ver Talasnal plantada em plena serra com o Trevim por trás de si. Um par de quilómetros depois passa-se por uma discreta escadaria que nasce na estrada e desce pela encosta até ao âmago da aldeia. Daqui, vê-se uma cascata de tectos rosados a mergulhar no luxuriante verde.


À chegada, como num menu, há várias tabuletas envernizadas com letras bem legíveis e cuidadas, mostrando o nome e os números de telefone dos diversos alojamentos disponíveis: Casa Lausus, Casa do Forno, Casa da Urze e a Casa Princesa Peralta. No entanto, espalhados pela aldeia existem outros tantos que não constam neste menu. Surpreende a quantidade de alojamentos que existem aqui, uma aldeia que mesmo sendo uma das maiores das que pintalgam a Serra da Lousã, não deixa de ser pequena.

Há corrimões, subtilmente toscos, de madeira pintada de castanho escuro que nos direcciona em patamares para a aldeia.
Noto que há uma certa imponência nas casas relativamente à dimensão da aldeia. Elas estão visivelmente recuperadas. Portas bem envernizadas de castanho denso, o xisto está limpo do verde do tempo e o pavimento está forrado com lajes de xisto de aspecto recente. O movimento de pessoas é significativo.
É preciso descer mais alguns degraus para perder este ar turístico e encontrar os aromas genuínos do que a aldeia já foi.

Quase não se vê ninguém por aqui. Não há lojas a vender idiotices plastificadas, restaurantes ou bares. Há um misto de casas recuperadas com abandonadas.
Quem restaurou as casas, fê-lo para si. Não parecem padecer da pesada maleita do turismo.
Soube resguardar a história, não a substituindo por uma carteira volumosa.
"É gente endinheirada que vem de Coimbra, Lisboa, passar aqui os fins de semana"
Esta é uma frase que facilmente se ouve nas aldeias, xisto ou não, castigadas pela desertificação das gentes. A fuga ao ruído, à velocidade, ao alcatrão do negro das cidades, contrapõe-se redescoberta do verde, do azul, dos pássaros, do cantarolar dos ribeiros. A cidade que as esvaziou, está agora a repovoá-las.

Sente-se a verticalidade da encosta e o contacto com o verde é bem mais tangível. Há humidade no ar e derrama-se no horizonte uma neblina que tinge o ambiente de um azulado acolhedor.
O tempo e o xisto estão de igual para igual, entrelaçando-se um no outro. As ruas são estreitas e escuras, há um verdete ligeiro no chão e este está lustroso e arredondado pelo uso.

De algumas janelas apenas sobram as molduras de madeira; as portas, também elas de madeira, estão empenadas, envelhecidas e descoloridas pelo sol e chuva, com trancas e ferrolhos quase inúteis. As trepadeiras conquistaram o seu lugar nas paredes e uma família de javalis desce ruidosamente pela encosta dando genuinamente sonoridades e um encantamento a Talasnal: uma aldeia perdida e encravada numa íngreme encosta, embrulhada em céu e floresta.













Comentários