série "Entre-Sóis" III - Rio Nilo, Egipto

Egipto, Dezembro 2010


A religião islâmica assenta em cinco grandes pilares. Um deles, é o Salah.
São cinco orações, para os sunitas, que são realizadas em alturas específicas do dia:

Fajr - ao nascer do sol
Zuhr - por volta do meio dia
Asr - ao entardecer
Maghrib - ao pôr-do-sol
Isha - antes da meia noite


A caminho de Luxor e com a pequena feluca ainda ancorada nas margens do rio Nilo, onde a noite tinha sido passada, Abdul - homem do leme e também cozinheiro do grupo - envolto numa túnica branca e abraçado pelo sol que lhe cria uma silhueta quase perfeita, prepara-se, aos primeiros raios de sol, para a primeira oração do dia.
Devagar, quase sustendo a respiração, levantei a câmara e tirei-lhe duas ou três fotografias. Imerso naquele silêncio madrugador, cada clic da câmara soou a explosão.

Bem antes de chegar a este momento, Abdul tinha passado o dia anterior, a navegar a sua elegante feluca, Nilo abaixo, desde Assuão.
Nela, tal como uma serpente que deixa para trás a sua exúvia para exibir a nova pele, brilhante e rejuvenescida, larguei os meus pensamentos e fui em busca de novos. Que fossem límpidos, despretensiosos, tranquilos. Tornei-os azuis como o céu, simples como a vela triangular da pequena embarcação, fluidos com as água do Nilo a passarem entre os meus dedos quando nelas os mergulhava, suaves e constantes como o incessante ziguezaguear da bolina imposta por Abdul.
Um toldo evitava que o sol açoitasse o nosso corpo e a brisa canalizada por ele fazia levantar as páginas dos livros que alguns liam.
Foram longas horas de paz, em comunhão com o maior rio do mundo, cheio de história como poucos, que desenhou um país (na verdade foram vários) ao longo do seu trajecto e com um deus a personificá-lo: Hapi.

Quando Abdul no fim desse dia ancora o pequeno barco para passar a noite, dá ao grupo duas hipóteses. Ou dormimos a bordo ou nas tendas que ele iria montar. Sem hesitar, escolho a feluca.
Enrolo-me em mantas e durmo em cima de uma esteira pouco confortável. Entretanto, Abdul tinha baixado umas espécies de cortinas laterais e ficámos mais protegidos do frio da noite.

Poucas coisas há mais eficazes para me acordarem que a luz. Ainda o sol não tinha nascido e já entrava luz um pouco por todo o lado na feluca. Por isso acordo e levanto-me para caminhar pelas margens do Nilo. Outras embarcações iguais estavam também ancoradas. Há sobras de fogueiras abafadas com terra e algumas shishas estão abandonadas aqui e ali.
Oiço movimentos na minha feluca e retorno a ela. Encontro Abdul na proa, já com o tapete de orações muçulmano (sajjadah) estendido à sua frente, a preparar-se para a Fajr.






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