dez anos, dez maravilhas IV - Sigiriya, Sri Lanka


Sigiriya, Sri Lanka - Outubro 2017

Sigiriya começa com um assassinato, continua com o medo da consequência do mesmo e acaba com o suicídio do assassino. Uma história curiosa e dramática.

Corria o ano 477. Kashyapa, filho ilegítimo do rei do Sri Lanka, mata o seu pai, o rei Dhatusena e rouba o trono ao verdadeiro herdeiro e seu meio-irmão, Mogallana. Kashyapa temendo as represálias do seu irmão deixa Anuradhapura e funda a capital em Sigiriya, construindo uma cidade fortaleza no topo. Outra possibilidade colocada afirma que Kashyapa não terá fundado a cidade mas sim dado continuidade ao que o seu pai já tinha começado.
Dezoito anos depois, em 495, Moggalana regressa para reclamar o que era seu de direito. Durante a batalha, percebendo que a derrota é certa, Kashyapa comete suicídio deixando-se cair sobre a sua espada. Outra versão, conta que com a sua adaga corta a própria garganta. Moggallana, após a vitória restaura a capital em Anuradhapura.
Certo é que após estes acontecimentos, Sigiriya passa para a posse de monges budistas sendo posteriormente abandonada e esquecida. É em pleno século XIX, em 1831, ao ser descoberta por soldados britânicos, que esta fortaleza ganha de novo visibilidade.

A subida é longa e incessante. Ora mais nivelada, ora mais inclinada. Há sinais para termos cuidado com vespas e frequentemente temos a companhia de macacos. Atravessam-se jardins e terraços, lagos e fossos, passa-se por debaixo de grandes e pesadas pedras, contornam-se outras. A verticalidade da subida é uma constante. Chega-se a um patamar onde duas enormes patas de leão esculpidas na rocha granítica inevitavelmente captam a nossa atenção. 
As patas são o que resta de um corpo de leão também esculpido na rocha. Aliás, o nome Sigiriya faz jus a essa mesma escultura, significa Leão na Rocha. Moggallana e a erosão dos tempos destruíram o que falta do seu corpo.
Retoma-se a subida, a parte final, pela escadaria que existe entre as patas e transita-se para outras em ferro. De novo a verticalidade está bem presente. Não são momentos fáceis para quem sofre de vertigens. Encontramos uns frescos pintados na face da rocha.




Estas pinturas por si valem a pena a subida a este monólito granítico. Ao longo de um mural com vários metros de comprido, as pinturas representam o que se pensam ser as mulheres, concubinas ou até sacerdotisas do rei Kashyapa. Apsaras, talvez. São mulheres semi-nuas, pintadas em cores quentes, principalmente amarelos e ocres, surpreendentemente detalhadas, que flutuam em nuvens trazendo flores e fruta nas mãos, outras em bandejas, talvez em jeito de oferendas aos deuses.

No topo nada se interpõe entre nós e o horizonte. A paisagem que nos vem acompanhando desde que começamos a subir é vasta e aberta. Sigiriya e Pidurangala, onde tinha estado no dia anterior para ver o monólito rochoso onde me encontro agora e assistir ao pôr-do-sol, são duas ilhas rochosas plantadas numa imensa planície forrada a verde da selva. 
No topo, tenho a verdadeira noção das dimensões de Sigiriya. Não são só os duzentos metros de altura que impressionam. A citadela do rei Kashyapa espraia-se por uns incríveis de três quilómetros de comprido por quase um quilómetro de largura. São visíveis os terraços, os jardins, as paredes das fortificações, as piscinas. Restos de algo que se sabe que outrora foi imponente e majestoso. 
Cirando de um lado para o outro, subindo e descendo escadas e socalcos, surpreendido com a complexidade do que vejo mas também com a paisagem que me rodeia.



Procuro as escadas que me levarão para baixo, para as patas do leão e depois aos jardins da base deste monólito. 
Penso na visão e na capacidade de concretização que é preciso ter para que leve alguém olhar para o alto de um gigantesco calhau perdido numa imensa planície verde e pensar que podia construir algo que continua a fascinar e a espantar mil e quinhentos anos depois. 






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