Paquistão - talvez as piores (e mais bonitas) estradas do mundo


O norte do Paquistão é maravilhosamente montanhoso. 
Três grandes cordilheiras abraçam esta lindíssima zona do país: Himalaias, Karakoram e a Hindu Kush. Nelas, estão semeadas gigantes de 8, 7 e 6000 metros. O carácter rochoso das paisagens é bem vincado. Faces verticais que terminam em abruptos Vs, cumes nevados são frequentes e rios e riachos de cor azul metalizado ondulam acompanhando a sinuosidade das estradas. 
Se as paisagens são de cortar a respiração e o pasmo é permanente pela sua majestosidade, há, no entanto, um forte preço a pagar por elas: a qualidade das estradas.
Diria que o Paquistão montanhoso deve ter as piores estradas do mundo. Não necessariamente pela sua perigosidade mas por não haver um pingo de alcatrão semeado nelas.


As estradas estão talhadas, rasgadas, nas faces das montanhas. De um lado a montanha, do outro, frequentemente o vazio. Os condutores paquistaneses conduzem por debaixo de tectos rochosos irregulares cujas pedras pendem como dentes de um crocodilo prestes a fechar com estrondo a sua mandíbula. O piso por onde circulam é feito da mesma rocha irregular que a face da montanha.
Dada a dimensão e verticalidade das encostas, cimentar ou montar uma rede metálica de contenção não é viável, nem fisicamente, nem financeiramente.

Esta situação levanta a primeira grande dificuldade: está longe de ser um evento raro a queda de grandes (e não só) blocos rochosos que obstruem as estradas, que as destroem e que alteram os limites físicos das mesmas. Dado a quantidade de tempo e quilómetros percorridos nelas, sempre pensei que uma haveria de nos cair em cima. Partir e remover estes blocos é uma necessidade quase permanente.
O segundo problema são as monções. Quando chove, chove a sério e durante bastante tempo. A consequências de chuvas fortes e persistentes durante semanas em montanha são o risco comum de deslizamentos e abatimentos de terras.




Como se não bastasse as anteriores causas por motivos naturais, estas estradas enfrentam um terceiro problema que em nada se relaciona com a natureza das mesmas: a corrupção por parte daquilo que nós poderemos chamar de autarquias. O governo central liberta fundos para a reabilitação, reconstrução e construção de estradas e nada acontece. O dinheiro fica nos bolsos dos políticos que as gerem. Um gesto universal... Cruzei-me com cartazes colocados na beira das estradas e pessoas que protestavam contra esta corrupção.

Alcatroar não faz sentido porque tecnicamente é extremamente difícil e porque o país não tem a capacidade financeira, e logística, para o fazer e muito menos para realizar a manutenção regular das mesmas.
Mas não significa que estas estradas estejam ao abandono. É frequente encontrar maquinaria pesada a remover obstáculos das estradadas, a partir os blocos de rocha maiores, alisar o melhor possível a irregularidade do piso, também ele rochoso, e enormes nuvens de poeiras que demoram a assentar.
Conduzir nas estradas montanhosas é um pesadelo para as nossas costas, para os condutores e para os próprios carros (e motas) que nelas circulam.
Percorrer duzentos, trezentos quilómetros nestas condições significa termos pela frente 8, 9 ou mais horas de condução.



Há um lado positivo. Estar parado à espera que haja condições para os carros poderem passar pelas máquinas, que pode exigir um par de horas, é estar na presença dessas paisagens sublimes, ver os locais a chegarem, vermos as suas vestes e quando a curiosidade vence a barreira cultural, dar dois dedos de conversa com alguém disposto a isso e, pelo meio, tirar umas quantas fotografias aos paquistaneses e eles a nós. Um ganho mútuo, portanto. Lamuriar, praguejar ou protestar contra quem quer seja é absolutamente inútil. Não muda nada, além de representar uma perda de oportunidades únicas.
Se possível, é sair para as estradas o mais cedo possível para evitar o começo destes trabalhos.












Comentários