Crónicas da Turquia - até à próxima


Esta viagem de cerca de 2 semanas pela Turquia, foi dividida mais ou menos ao meio. Istambul e Capadócia. O plano era passar uns dias em Istambul (Natal incluído), voar para a Capadócia e voltar de novo a tempo do Ano Novo para Istambul.

Istambul é uma cidade muito marcante. Eu diria que é viciante e absorvente.
Quando deixei Istambul para ir para a Capadócia houve uma parte de mim que ansiava por voltar.
A Capadócia é um contraponto a esta grande cidade. É vasta, calma, de horizontes longínquos e abertos. É sóbria. É menos vibrante e monótona nas suas cores. O tempo corre devagar, sem pressas.
Sendo turística não o é excessivamente. Não possui o poder magnético que Istambul exerce sobre nós.
Percebe-se facilmente que é uma região mais pobre e dura. Também por isso mais pura e genuína.
O turco aqui tem feições mais rudes e marcadas. Justifica-se. A vida é também mais dura e isolada e o tempo pode ser inclemente. Neles abunda o bigode, nelas abunda os véus.

É difícil encontrar alguém que fale inglês. Mesmo o básico. Um pedido de informações é um desafio. Só com várias tentativas e juntando muitos gestos às poucas palavras de inglês percebidas é que se fica com uma certa probabilidade de que talvez tenhamos obtido a informação desejada.
Em Göreme a situação muda ligeiramente. Por força da convergência de turistas para esta localidade, os véus e os bigodes diminuem, as feições suavizam-se e o inglês melhora.

Para variar, Portugal seria um país desconhecido não fosse o futebol. Figo, Ronaldo e o Benfica estão no panteão internacional do nosso país.
Yuri, ucraniano de 31, anos é um exemplo claro disso. Partilhando os poucos raios de sol que passavam pelas estreitas frinchas dos prédios que lhe faziam barreira matinal, este condutor do mini bus que ligava Nevsehir ao aeroporto homónimo seria o exemplo acabado desta situação.
Percebendo que não era local, perguntou-me de onde vinha. À resposta Portugal, desfiou nomes que eu com alguma dificuldade reconheci como futebolistas maioritariamente do Benfica e alguns do Porto.
De tema difícil para mim, foi com monossílabos que respondi às suas perguntas bem informadas sobre o futebol nacional.
Quis dar uma outra imagem do nosso país. Disse que éramos um país de sol, de conquistadores, boa gastronomia e boa gente. Sem sucesso. Estes temas não são universais. O futebol é.
Quando esfregando as mãos uma sobre a outra disse "time to go" percebi que a tortura tinha acabado e subi para o autocarro algo agastado com o nosso país. Sempre me causou (e causa) desilusão esta associação a um desporto que para mim é desinteressante e pouco transparente.


Quando estou em viagem e passo algum tempo num determinado local, ao final do dia existe sempre um sítio onde me "refugio". Um sítio onde o passo se torna mais lento, onde gosto de saborear e rever o dia que passei, olhar na máquina fotográfica os instantes captados. Esse sítio em Istambul, para mim, é a praça Eminönü. Uma praça salpicada pelo Corno Dourado. É aqui que a cidade se define e se mostra a quem por ela passa.

Aqui contemplamos as principais mesquitas (Mesquita Azul, Nova Mesquita e Mesquita Suleiman) de Istambul, os nossos olhos são atraídos pelo correr das linhas dos pescadores da Ponte Gálata e pelo romantismo dourado que o sol poente confere à linha de horizonte do bairro de Gálata e Taksim. 
Captamos a sonoridade dos ferries que atravessam o Corno Dourado, a massa de gente que circula entre as suas duas margens, as gaivotas que disputam o peixe e um pouso nas amuradas. Mas é a chamada para as orações diárias (salat) dos "muezzin", cujas vozes amplificadas pelos microfones proporcionam uma paisagem sonora inesquecível que se impregna na memória.
Nesta praça libertam-se os suaves mas intensos aromas do Bazar Egípcio, do "balik ekmek", do peixe apanhado pelos pescadores e da oleosidade das águas agitadas pelos ferries.
É aqui que existe uma das entradas para o Grande Bazar. Um imenso e denso mistério labiríntico de cores, pregões, aromas, têxteis, metais, gente e mais gente.

Istambul é moderna, liberal e com influências ocidentais sem no entanto perder a sua identidade. A religião islâmica é moderada. Os casais andam de mão dada e as botas altas, mini saias e os leggins convivem com os lenços coloridos que tapam os cabelos femininos. Os véus (hijab) e o "chador" (veste feminina que cobre o corpo à excepção do rosto) não são tão frequentes quanto seria de esperar numa cidade islâmica.
Talvez o seu maior encanto e fascínio venha daquilo que mais a caracteriza: cidade milenar, encontro de impérios, encruzilhada de culturas e ponte entre dois continentes.

Um postal a não perder em Istambul: um cruzeiro pelo Bósforo com o regresso a ser feito à hora do pôr-do-sol. Magia. De preferência partilhada com alguém especial.

Parafraseando o final de um dos primeiros posts das Crónicas que coloquei diria: Gostei de Istambul e da Turquia. Foi inevitável.

Um brinde a ti Turquia, com raki claro.


O Raki, é uma bebida alcoólica (40 a 45%), anisada muito popular por toda a Turquia que se bebe preferencialmente misturada com água adquirindo uma cor ligeiramente leitosa quando em contacto com esta.


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