série "Rostos do Meu Rosto" - IV

A meio caminho entre Hanoi e Ha Long Bay, o condutor da van que levava um grupo de viajantes para os barcos de Ha Long Bay fez um desvio da estrada principal e pouco tempo depois parou a poucas dezenas de metros de uma oficina de produção totalmente manual de vasos e outras pequenas peças de barro e de cerâmica.

Havia fornos de cozer feitos de tijolo e vários vasos em fases diferentes de produção, alinhados consoante o passo seguinte a dar. Havia poucas pessoas a trabalhar. Entre elas, duas senhoras pintavam vasos com decorações simples.
Uma tinha o seu vaso apoiado numa travessa de madeira à altura do seu peito. Inclinava-o com uma mão, num equilíbrio ditado pela prática, e pintava com a outra. Dessa mão, nasciam sequências de flores de lótus, todas pintadas a um azul pouco vibrante.
Enquanto a "equilibrista" tinha ganho a atenção das pessoas que comigo partilhavam o mesmo destino que o meu, eu procurei propositadamente a "elegância" da senhora, de olhos tímidos e castanhos profundos, da roda de oleiro. Com o seu consentimento puxei de um banco que estava num canto, sorri-lhe, sentei-me ao seu lado e fiquei a admirar o seu trabalho.

A sua peça estava colocada numa roda de oleiro que girava. Traçava linhas com segurança no topo do vaso. Ocasionalmente, entre duas linhas, ondulava a sua mão e curvas suaves e elegantes surgiam na superfície da peça que trabalhava. Parou, não pareceu que tivesse acabado, e traçou destramente cenas rurais — juncos, montanhas, árvores simples e casas — no corpo do vaso. Acabou o que tinha entre mãos, pegou noutro e recomeçou o trabalho num vaso completamente novo. A sequência de trabalho e de motivos foi exatamente igual.

No primeiro vaso fotografei apenas as suas mãos e o vaso onde trabalhava. No segundo, gradualmente aproximei-me do seu rosto e fotografei-a. Mostrei todas as imagens que tinha tirado. Tocou no ecrã em duas delas. Ambas mostravam o seu rosto. Das duas escolhidas pela artesã, escolhi esta. 
Mostra a timidez dos seus olhos, o seu rosto bonito, e permite adivinhar a delicadeza do movimento.

Os que tinham estado com a primeira senhora, estavam agora a caminho da "minha" artista. 
Tempo de me retirar.

Hanoi, Vietname







Comentários

  1. Uma foto de um rosto pode dizer, de facto, muito. Mais do que palavras, por vezes. Ou pode até contradizê-las. São momentos que ficam imortalizados.
    Todas estas fotos são belas! Todas! Cada uma à sua maneira...Pedaços de vida que nos mostras de forma muito genuína. Obrigada :)

    ResponderEliminar

Enviar um comentário